Princípio e pragmatismo: nunca é bom desafiar a economia
Vacina na rede privada ajuda até quem não tem dinheiro
Está posto o debate: poderiam as empresas privadas comprar vacinas ou todos devem esperar a fila do SUS? Dilemas éticos fazem parte do nosso dia a dia, não há como escapar. Dados os problemas da pandemia, a vacina virou panaceia e todos querem dar um pitaco, inclusive, como quase sempre, este que vos escreve.
Nós, como bons brasileiros, adoramos uma fila. Somos ímpares neste conceito. Fila de banco, fila de restaurante, fila em ônibus e até em estádio de futebol: seja uma obrigação ou uma diversão, há fila para todos os gostos. A fila da vacina nos traz um tipo de escolha de Sofia, e escolher qual dos filhos deve morrer na câmara de gás nunca será uma tarefa fácil para a mãe. Entretanto, permita-me colocar algumas lanternas nessa popa, partindo do princípio hipotético de que a vacina é eficaz e todos querem tomá-la.
1 – A fila de vacinação contempla pessoas que geralmente não contribuem para a economia, sejam aposentados, índios ou quilombolas. Nesse cenário o PIB tende a demorar mais a engrenar, trazendo dificuldades reais – inflação e/ou desabastecimento - que vão prejudicar inclusive o grupo prioritário. 2- É errado dizer que se a vacina sair do SUS faltará para os pobres. O que sempre falta para os pobres são insumos/produtos que só são usados por pobres, como ônibus e remédios para doenças derivadas de falta de saneamento básico. Não há escassez de produtos que ricos e pobres desejam consumir. 3 – Aumentando o número de pessoas "não prioritárias" vacinadas é excelente inclusive para a "prioritárias" não vacinadas, dado que o contágio se reduz. 4- Entender bem o que somos: um país de 3º mundo de dimensões continentais com 208 milhões de habitantes. Calculando por baixo, e contando duas doses por vacina, precisaremos de no mínimo 416 milhões de doses. É um esforço logístico surreal para apenas um órgão público. O SUS é bom mas não é excelente.
Alguns métodos de solidariedade propostos também são válidos, como a proposta que está no congresso de obrigar as empresas que comprarem vacina destinarem 50% da compra para o SUS. Dá para calibrar o modelo de várias formas. O que não dá é para fechar o olho para a nossa realidade. Nenhum produto, seja ele vacina, remédio, alimento, veículo ou DVD deve ficar a cargo do Estado de maneira exclusiva, tanto produção quanto distribuição. Não é bom desafiar a vacina. E nem a economia.
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