Conselho afirma que escola demonizou a polícia ao representar agentes com chifres
O Conselho Nacional dos Comandantes-Gerais das Polícias Militares do Brasil (CNGG-PM) publicou uma nota de repúdio à Escola de Samba Vai-Vai, do Carnaval de São Paulo, devido à crítica feita à polícia durante o desfile no último sábado (10).
O Conselho afirmou que a escola de samba demonizou a polícia ao representar agentes com chifres e outros elementos no Anhembi, Zona Norte da capital paulista.
"A pretexto de retratar a 'realidade' e expressar sua 'arte', os carnavalescos da sobredita entidade foram extremamente deselegantes e levianos, ao propagar uma visão distorcida e preconceituosa a respeito do trabalho de uma instituição essencial à manutenção do Estado Democrático de Direito e garantidora do exercício pleno da cidadania", disse a nota. (Confira a íntegra no final da matéria.)
Entenda o enredo
Com o samba-enredo "Capítulo 4, Versículo 3 – Da rua e do povo, o Hip Hop: um manifesto paulistano", o desfile prestou homenagem ao álbum "Sobrevivendo no Inferno", dos Racionais MC's, um dos mais marcantes do gênero. Lançado em 1997, o disco retratava a onda de brutalidade policial pela qual passava São Paulo na década de 1990.
O caso mais conhecido da época foi o massacre do Carandiru, em 1992, a maior chacina já registrada em um presídio. O episódio sombrio foi registrado pelos Racionais na música "Diário de um detento", que pertence ao álbum homenageado pela Vai-Vai e, consequentemente, foi parar no desfile de 2024.
O outro lado
A Vai-Vai, por sua vez, afirmou que não teve a intenção de promover qualquer ataque ou provocação. Em nota, a escola paulistana reafirmou o conteúdo da alegoria e disse que tem "liberdade" para encená-lo.
"Na década de 90, a segurança pública no estado de São Paulo era uma questão importante e latente, com índices altíssimos de mortalidade da população preta e periférica", disse. (Confira a íntegra da nota no final da matéria.)
Leia a nota do CNCG na íntegra:
O CONSELHO NACIONAL DOS COMANDANTES-GERAIS DAS POLÍCIAS MILITARES DO BRASIL – CNCG-PM, colegiado que reúne todos os comandantes de Polícias Militares em exercício, vem a público manifestar, veementemente, repúdio e indignação à descabida e inaceitável referência feita às Polícias Militares e aos seus integrantes pelo Grêmio Recreativo Cultural e Social Escola de Samba Vai-Vai, na noite do último sábado (10/2), durante o desfile da agremiação, no Sambódromo do Anhembi, em São Paulo-SP.
A pretexto de retratar a "realidade" e expressar a "sua arte", os carnavalescos da sobredita entidade foram extremamente deselegantes e levianos ao propagar uma visão distorcida e preconceituosa a respeito do trabalho de uma instituição essencial à manutenção do Estado Democrático de Direito e garantidora do exercício pleno da cidadania.
Curiosamente, o lamentável episódio ocorre exatamente no momento em que milhares de homens e mulheres policiais militares estão empenhados na segurança e na proteção de milhões de pessoas que estão (ou não) no desfrute dos momentos de alegria proporcionados pelo período momesco nos diferentes rincões do Brasil.
Por fim, o CNCG-PM reafirma o compromisso das Polícias Militares com a defesa intransigente da ética e com o provimento de uma segurança pública de excelência para todos os brasileiros e brasileiras.
Brasília-DF, 13 de fevereiro de 2024.
Leia a nota da Vai-Vai na íntegra:
"Na década de 90 a segurança pública no estado de São Paulo era uma questão importante e latente, com índices altíssimos de mortalidade da população preta e periférica. Além disso, é de conhecimento público que os precursores do movimento hip hop no Brasil eram marginalizados e tratados como vagabundos, sofrendo repressão e, sendo presos, muitas vezes, apenas por dançarem e adotarem um estilo de vestimenta considerado inadequado pra época.
Neste contexto, foram feitos, ao longo do desfile, uma série de recortes históricos, como a semana de arte de 1922 e o lançamento do álbum "Sobrevivendo no Inferno", dos Racionais MCs, em 1997. "Sobrevivendo no Inferno" é o segundo álbum de estúdio do grupo, lançado pelo selo da gravadora Cosa Nostra em 20 de dezembro de 1997.
É considerado o álbum mais importante do rap brasileiro. Em 2007, figurou na 14ª posição da lista dos 100 melhores discos da música brasileira pela Rolling Stone Brasil. Em 2018, o álbum foi incluído pela Comvest (Comissão Permanente para os Vestibulares da Universidade Estadual de Campinas) na lista de obras de leitura obrigatória para o vestibular da Unicamp a partir de 2020. Meses depois, a obra virou livro, publicado pela Companhia das Letras, tamanha sua relevância.
Segundo a Revista Rolling Stone Brasil, que ranqueou o álbum na 14ª posição da lista dos 100 melhores discos da música brasileira, "Sobrevivendo no Inferno colocou o rap no topo das paradas, vendendo mais de meio milhão de cópias. Racismo, miséria e desigualdade social — temas cutucados nos discos anteriores — são aqui expostos como uma grande ferida aberta, vide 'Diário de um Detento', inspirada na grande chacina do Carandiru".
Ou seja, a ala retratada no desfile de sábado, da escola de samba Vai-Vai, à luz da liberdade e ludicidade que o carnaval permite, fez uma justa homenagem ao álbum e ao próprio Racionais Mcs, sem a intenção de promover qualquer tipo de ataque individualizado ou provocação, mas sim uma ala, como as outras 19 apresentadas pela escola, que homenageiam um movimento.
Vale ressaltar que, neste recorte histórico da década de 90, a segurança pública no estado de São Paulo era uma questão importante e latente, com índices altíssimos de mortalidade da população preta e periférica. Além disso, é de conhecimento público que os precursores do movimento hip hop no Brasil eram marginalizados e tratados como vagabundos, sofrendo repressão e, sendo presos, muitas vezes, apenas por dançarem e adotarem um estilo de vestimenta considerado inadequado pra época. O que a escola fez, na avenida, foi inserir o álbum e os acontecimentos históricos no contexto que eles ocorreram, no enredo do desfile."
Com informações Em Dia ES